segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Por um Marxismo Autogestionário!!!

Por um Marxismo Autogestionário


O fracasso do total da socialdemocracia, engolida pelo neoliberalismo e reduzida a ala esquerda do mesmo com o seu microrreformismo, e do bolchevismo, decadente desde a crise do capitalismo estatal, é um momento que a retomada do marxismo se torna ordem do dia. A socialdemocracia e o bolchevismo (“marxismo”-leninismo) não foram superados? A superação teórica da socialdemocracia data do início do século 20 e a do bolchevismo alguns anos depois, enquanto que a superação prática ainda se concretizou totalmente, mas se iniciou com a ascensão do neoliberalismo e fracasso do capitalismo de Estado. No entanto, socialdemocracia e bolchevismo, como já colocava o historiador Arthur Rosenberg, nada tem a ver com o marxismo e a derrocada dessas ideologias e suas instituições (especialmente os partidos da pseudoesquerda) abrem espaço para a retomada do marxismo autêntico.

O marxismo autêntico surgiu com as obras de Marx e Engels, aproximadamente na metade do século 19, ainda durante o regime de acumulação extensivo, sendo sua primeira fase de desenvolvimento. Já na época próxima a morte de Marx e recuo do movimento operário após a derrota da Comuna de Paris, emergindo o regime de acumulação intensivo, temos o marxismo resiliente de Marx convivendo com o nascimento do pseudomarxismo da socialdemocracia. Esta, após a morte de Marx e inicialmente com a colaboração de Engels, será a tendência hegemônica e supostamente “ortodoxa”, o que durará até a primeira crise do regime de acumulação intensivo. O que havia de mais próximo do marxismo era a dissidência no interior da socialdemocracia, representada pelos tribunistas holandeses (Holand-Host, Pannekoek, Gorter), Rosa Luxemburgo e seus aliados na Alemanha (que posteriormente formariam a Liga Spartacus), entre outros. O marxismo autêntico sobreviveria, nessa época, marginalmente, com indivíduos afastados (como Antonio Labriola) ou críticos e opositores da socialdemocracia (Makhaïsky).

A crise do regime de acumulação intensivo que gera a primeira guerra mundial marca um avanço no sentido de superação da socialdemocracia, emergindo as diversas tendências do “socialismo radical”, na qual as tendências representadas pelo espartaquismo (Rosa Luxemburgo, Karl Liebnecht, Leo Jogiches, Franz Mehring, etc.), o comunismo internacionalista (Otto Rühle e outros) e Esquerda de Breme (Pannekoek, Gorter e outros) são aqueles que retomam vários aspectos do marxismo e avançam para a retomada do marxismo autentico, que, no entanto, só ocorrerá efetivamente alguns anos depois. A emergência do bolchevismo e do golpe de estado de 1917 na Rússia abre uma nova hegemonia no pseudomarxismo. A nova ortodoxia, herdeira e substituta da socialdemocracia, no fundo partilhava seus elementos essenciais, só que com maior “radicalismo” discursivo e com estratégia insurrecionalista ao invés de eleitoral, o que permitiu, principalmente por falta de informações sobre o que ocorria no primeiro país capitalista estatal, uma ação conjunta. A Revolução Alemã e a tentativa de uma nova hegemonia (“ortodoxia”), a do bolchevismo (que vai desembocar na bolchevização dos partidos comunistas) abriu o momento para finalmente haver um ressurgimento do marxismo autêntico, através da ruptura dos “comunistas de conselhos” (Pannekoek, Rühle, Gorter, Wagner, Mattick, etc.) com os bolcheviques, “comunistas de partido”. Nesse mesmo momento, a esquerda extraparlamentar inglesa com Sylvia Pankhurst e outros também rompiam com o bolchevismo e colaboravam nessa retomada do marxismo.

A derrota do movimento revolucionário do proletariado na Rússia, Alemanha, Hungria, Itália, entre outros países, promoveu um recuo do marxismo autêntico no plano da luta política, embora o comunismo de conselhos tenha se preservado através de diversos grupos políticos e produção intelectual. A ascensão do nazifascismo, no entanto, acabou obliterando o marxismo autêntico na Europa Ocidental e o bolchevismo acabou saindo como a grande expressão do marxismo através de sua deformação e transformação em ideologia legitimadora do capitalismo estatal nacional russo, que culmina com o stalinismo e seu irmão gêmeo supostamente opositor, o trotskismo. A Segunda Guerra Mundial foi o final desse capítulo da história e o regime de acumulação conjugado, emergente após isto, promoveu uma estratégia de manutenção do capitalismo através dos grandes oligopólios transnacionais que dividiu a classe operária mundial, garantido, graças à superexploração do proletariado do capitalismo subordinado (“terceiro mundo”), a estabilidade do capitalismo imperialista através de transformação dos sindicatos em aparatos do capital e elevação dos níveis salariais e de consumo (graças, além da exploração internacional, do fordismo, produção em massa, sistema de crédito, etc.). O marxismo autêntico se manteve vivo graças à colaboração teórica do comunismo conselhista (Pannekoek, Mattick, Korsch), mas sem grande ressonância nas lutas sociais, bem como em posições ambíguas, tal como o situacionismo e outras. A crise do regime de acumulação conjugado contribuiu para uma retomada parcial do marxismo autêntico, tanto no sentido de retomar a radicalidade do pensamento de Marx quanto dos comunistas de conselhos, além de outras contribuições marginais.


A ascensão do neoliberalismo e derrocada do capitalismo estatal, a partir da emergência do regime de acumulação integral, enfraqueceram bastante as duas principais formas de deformação do marxismo, o pseudomarxismo socialdemocrata e bolchevique. Isso abriu espaço para retomado, mesmo que parcial e ambígua, muitas vezes de forma dogmática ou eclética, do marxismo autêntico. É nesse momento que começa a emergir uma nova fase do marxismo autêntico, que retoma as contribuições fundamentais de Marx, do comunismo de conselhos e outros intelectuais, grupos, militantes, que foram marginalizados, colocando como centro da teoria marxista o projeto autogestionário. Assim, o marxismo autogestionário é a forma atual e contemporânea de manifestação do marxismo autêntico. Sem dúvida, o marxismo sempre foi autogestionário, apesar das falsificações ideológicas que tentaram lhe retirar esse caráter. Contudo, a síntese atual do marxismo com a retomada desse caráter autogestionário, com sua atualização e foco no projeto de sociedade futura para lhe distinguir de todas as deformações do marxismo que buscam, quando buscam, apenas a reforma do capitalismo. Não se trata de lutar por um capitalismo reformado, seja com “estado de bem estar social” (uma impossibilidade no capitalismo contemporâneo) ou capitalismo estatal, ou qualquer outra proposta que não abole o capital e seus aparatos de reprodução (tal como o Estado) e sim pela autogestão social. Por isso é o momento do marxismo autogestionário, a forma contemporânea do marxismo autêntico. Então é hora de consolidar, tanto na teoria quanto na prática, o marxismo autogestionário, a expressão teórica do movimento revolucionário do proletariado na época contemporânea, uma era que anuncia uma nova crise do capitalismo e a possibilidade da revolução proletária e emancipação humana.

Editorial da Revista Marxismo e Autogestão, ano 01, vol. 01, num. 02, 2014:

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